terça-feira, 31 de maio de 2011

A Marcha de la Tyrannie (Crítica: V de Vingança / 2006)



O povo não deve temer seus governantes. Os governantes que deveriam temer o povo.

Já é mais do que escancarada minha paixão pela atriz Natalie Portman, dentre os poucos posts do Cinemática Br, esse já é o terceiro que traz a atriz israelense. Não escolhi esse filme simplesmente por trazer Portman. Escolhi porque se trata de uma obra espetacular, visionária (ou nostálgica, aí depende do seu ponto de vista) e completa, embora cometa alguns exageros em certas partes.

V de Vingança (V for Vendetta, 2006. EUA) é baseado nos quadrinhos de Alan Moore e David Lloyd, que foram publicados na Inglaterra durante a década de 1980 e no livro 1984 de George Orwell, escrito em 1948. Podemos dizer que tudo é adaptado de uma adaptação. É complicada essa história de adaptar quadrinhos para o Cinema, justamente porque os leitores de quadrinhos são aqueles mais fervorosos e “nerds” (com o perdão da palavra) possíveis. Eles querem ver uma adaptação fiel ao extremo, coisa que sabemos que não é possível, não tem como mesmo (imagine um filme sem sentido com 6 ou 7 horas de duração, definitivamente não rola) e quando essa fidelidade não se torna real eles se rebelam, organizam-se na frente da produtora e aí é aquele inferno. Basta entender que cinema não é igual a nada, nem a TV ou teatro, e muito menos a Literatura. No caso de V de Vingança, em que o autor dos quadrinhos Alan Moore se recusou a ter seu nome nos créditos finais, devido a essa “falta de fidelidade”, a história é muito melhor que os quadrinhos, já que prefere um roteiro bem mais simplificado que o original.



O diretor James McTeigue (que até então só tinha se aventurado em co-direções) e os Irmãos Wachowski (trilogia Matrix – e que assinaram o roteiro de V de Vingança) optaram por uma direção e um roteiro mais simples, mais deficiente de personagens, em que tudo o que fosse apresentado na tela, seria profundamente desvendado. Assim, não encontraríamos tantos personagens rasos durante a película. Porém, o espírito libertário (que é o que torna o trabalho fiel aos quadrinhos de Alan Moore) é mantido e, ainda, revigorado.

Alan Moore escreveu os quadrinhos na época em que Magaret Tchatcher comandava a Inglaterra. Moore profetizou que o domínio rude de Tchatcher (ela tinha o apelido de “mão de ferro”) fosse levar a Inglaterra a um regime totalitário, quase que uma Alemanha nazista, em que homossexuais e negros seriam presos e proibidos de se misturar a uma chamada “raça pura”, todos os direitos humanos contestados e, assim, em nome da moral e dos bons costumes o mundo seria mais uma vez condenado. O que Moore não previu é que o conservadorismo inglês cairia com a eleição de Tony Blair ao posto de primeiro-ministro britânico. Mas, em algumas coisas ele acertou (HÁHÁ, espaço para minha risada macabra): o modo de agir de alguns terroristas, quando insatisfeitos com a forma de governo que rege seu país (ou sistema), e, assim, para mandar um recado para esses governantes, atacam símbolos de poder daquela pátria (no caso do filme é o Parlamento que explode, e se você pensou no Pentágono ou no World Trade Center, como forma de aludir ao mundo real, parabéns). E é por isso que a história de Moore é tão pertinente ao Cinema e à reflexão da sociedade



V de Vingança tem um pouco de tudo- romance, crítica social, política, suspense, ação, aventura – e tudo extremamente bem dosado. Alguns exageros se deverão, mais para o final do filme, aos efeitos especiais, mas mesmo assim, não comprometem tanto o filme.

Tentando resumir um pouco a história do filme, a trama se passa num futuro próximo, em que a Inglaterra tenta se reerguer novamente como uma potência global. Porém, o governo inglês é absolutista e corrupto. O líder do Parlamento Inglês (interpretado pelo veterano John Hurt) é conhecido como Chanceler, cargo que ocupava o nada saudoso Adolf Hitler, as cores que representam o governo também aludem ao Nazismo (preto e vermelho). Os meios de comunicação são dominados pelo Estado, a liberdade de expressão totalmente vetada, enfim, características de uma ditadura. Nesse contexto, aparece a figura de V (Hugo Weaving, o vilão de Matriz, que nem por um segundo enfrenta as câmeras sem máscara), uma espécie se super-heroi mascarado, determinado em eliminar esse regime fascista que domina a Inglaterra. É um heroi dos mais estranhos, culto e sensível e contará com a ajuda de Evey (a musa Natalie Portman), uma funcionária da televisão inglesa, com um amargo passado, e que foi salva por V das mãos dos policiais tiranos. Evey será a parceira na empreitada de V: explodir o prédio do Parlamento britânico.



Destruir um prédio fará desse mundo um lugar melhor? Perguntou Evey

V, imóvel, respondeu: Um prédio é um símbolo. Destruí-lo também.


É nítida a referência que os Irmãos Wachowski fazem ao 11 de setembro. Data que Osama Bin Laden ordenou os ataques terroristas ao país mais poderoso do mundo. O filme é cheio dessas referências. Mas cabe a você julgá-las. Osama Bin Laden comparado a V. Dois terroristas ou dois militantes em defesa da liberdade? Atos terroristas são constantemente atribuídos a defesa da liberdade. Isso é válido? Só estando na pele de um ser massacrado pelo sistema pra ter uma resposta concreta.

James McTeigue nem parece ser um estreante. Parece um veterano de guerra. Imprime agilidade e profundidade absurdas ao filme, é difícil se entregar a vontade de ir ao banheiro no meio do filme. Não dá vontade de tirar o olho. Hugo Weaving que tem que interpretar o personagem principal só a base de expressões corporais dá um show a parte. Natalie Portman se supera mais uma vez ao interpretar essa militante de garra, que sofre demais devido ao passado obscuro da personagem (a atriz raspou a cabeça em dado momento do filme). Vale ressaltar também o trabalho dos outros atores: Stephen Rea e Stephen Fry. A fotografia e a maquiagem do filme impõem um tom muito sombrio aos cenários, dá pra ver o medo pairando sobre Londres.



Taxado por uns como “subversivo”, V de Vingança é um filme, acima de tudo, inteligente. Não há como fugir da verve política mesmo, mas encontraremos dentro de nós mesmos um pedacinho do V, que luta contra essas injustiças que perduram na sociedade. Atente também para a cena da Marcha do Vs, é de arrepiar até o último fio de cabelo.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Não assistirás ao fim que tu causaste. (Crítica: Carrie - A Estranha / 1976)

Restabelecer o que nunca foi estabelecido.

Reaprender o que nunca foi aprendido.

Sussurrar o que nunca foi dito.

Quem é você no mundo? Isso, aquilo ou nada disso?

Quem segue do teu lado?

Quem você sente do teu lado? (e isso se resume num infinito superior a qualquer um milhão de palavras que possam te dizer).

Pena que ninguém disse nada a ela. Só fez com que ela sentisse que tudo era mentira e perverso.

Morre assim, então.



O que um filme de terror pode fazer num indivíduo? A mim pode subverter toda a ideia do que ele é e me mostrar o que REALMENTE ele é. E é isso o que ocorre em Carrie – A Estranha (Carrie, 1976. EUA). O filme que foi adaptado do livro de Stephen King tem em sua essência pura o horror, a vingança e o sangue, mas trata-se de um mundo a mais de coisas.

Carrie foi o primeiro livro escrito por Stephen King e quase não foi publicado devido a um surto do autor, que jogou todo o material no lixo, por sorte sua esposa resgatou o trabalho e então o livro foi publicado em 1974. Este também foi o primeiro livro do autor que ganhou uma adaptação cinematográfica.



Em 1975, o diretor Brian de Palma (início da carreira) resolveu adaptar o livro de King para o cinema. Tinha em mente seguir todo o livro de forma fiel, assim o filme seria só o meio visual de se entender o livro. Porém, Brian de Palma fez muito mais que isso, fez simplesmente um clássico do cinema mundial. Transformou uma história repleta de clichês num dos filmes mais vistos e comentados da história. Quem nunca ouviu falar de Carrie? Carrie sempre é relembrado quando o” bullying” entra nas discussões sociais e novelas brasileiras fazem, até hoje, cenas aludindo à obra.

Contar Carrie é como contar a história de milhões de pessoas do mundo, é comum encontrar gente que sofra que nem ela (mesmo sem os agravantes que essa jovem tem).

Carrie é uma jovem do ensino médio que nunca foi aceita por nenhum grupo ou indivíduo da sua escola, acredito que até da cidade. É aquela menina que ninguém passa a bola na educação física, que é tratada como um móvel dentro da sala de aula e sofre tudo isso calada. Não tem estrutura nenhuma pra se impor diante dessas pessoas e dessas situações. Todos os problemas de Carrie são agravados pela mãe (Piper Laurie, que faz uma mãe de arrepiar até o último fio de cabelo), uma fanática religiosa, que foi abandonada pelo marido e nunca aceitou Carrie como sendo fruto de um casamento, mas tem como certo que a filha é fruto do pecado, da entrada do demônio no seu corpo. Pra completar, Carrie tem poderes psíquicos que ela não consegue controlar em momentos de extrema fúria, a mãe tem consciência dos poderes e acredita que a filha é dominada pelos poderes do mal.



Na minha humilde opinião, a mãe é o maior problema na vida de Carrie. A jovem é mantida isolada do mundo, isolada das pessoas e ainda bombardeada por questões que vão além de seu poder de resolução. A mãe nunca contou à filha que uma menina menstruava (essa cena é de cortar o coração), tanto é que quando menstrua, Carrie acredita que está morrendo. As meninas da escola também são cruéis e perversas, são aquelas pessoas que matam outras indiretamente nos dias de hoje. Matam sonhos e planos. Sufocam o que um dia poderia ser uma linda vida a ser vivida.



Sissy Spacek (indicada ao Oscar de Melhor Atriz pelo filme) está em seu primeiro trabalho no cinema, e faz Carrie da forma mais brilhante possível. Amedronta-me no olhar, entristece-me nos mesmos olhos e me ganha, ainda, com esses mesmos olhos. Os Olhos. Ah os olhos!! Os olhos de Sissy Spacek merecem uma poesia.

Preferia mil vezes que o filme fosse de terror mesmo, pelo menos blindaria minha alma e meu coração contra o sofrimento de Carrie. Não é brincadeira o que essa menina sofre e o que tanta gente ainda sofre calada nos dias de hoje. Numa das últimas sequências do filme (talvez a penúltima, a do baile), toda essa blindagem que você tiver usando, caso ainda esteja, cairá por terra. Não tem como não querer pegar Carrie no colo e dar a ela todo o carinho que lhe negaram durante uma vida inteira. Toda a amizade que lhe privaram.



Os poderes paranormais que foram impressos na personagem é, de fato, só uma desculpa para o filme ser de terror. O filme é muito mais que isso. É uma abordagem repleta de lugares-comuns da vida de uma jovem que sofre bullying. Quer coisa mais natural que isso? Quem nunca viu um colega praticar bullying e deu uma gargalhada gostosa da cara daquele cidadão que estava sendo rechaçado na frente de todo mundo?

Mas isso é um blog de Cinema, desculpem-me.

A obra também merece ser lembrada por uma série de questões: a montagem, que é magnífica e trás uma série de cenas muito bem construídas, com ângulos diferenciados, com divisão da tela pra mostrar causa e efeito da cena; a fotografia, assustadoramente linda do instante em que Carrie toma um banho de sangue em diante e; trilha sonora, que lembra um pouco Psicose e dá todo um clima muito legal ao filme.

No geral. Carrie não tem segredos, trata-se de uma obra única que consegue ser de 25 anos atrás e mesmo assim tratar de um assunto tão contemporâneo. O final é um espetáculo a parte, que não merece que eu diga uma palavra sequer, afinal, posso fazer alguma injustiça.



Dedico o post aos amigos que assistiram ao filme comigo: Pedro Inácio, Stephanne, Léo (que dormiu o filme inteiro), End (que riu boa parte do filme), Adriano (dono do filme) e Ian.

(ahh.. não assistam a refilmagem, é uma merda!!)

terça-feira, 17 de maio de 2011

A Maçã Envenenada (Crítica: Dogville / 2003)



Inovar. Desafiar convenções.

É tão bom quando encontramos um filme e nos deparamos com uma proposta tão inovadora e arriscada, que dá certo e no fim de tudo só imprime qualidade e legitimidade a tal obra. Pois é, existe uma série de filmes com esses pré-requisitos, os melhores para mim (que não são do David Lynch) seriam Clube da Luta (1999) e Dogville.

Hoje resolvi falar de Dogville (2003. Dinamarca) do diretor dinamarquês Lars von Trier. Para quem não conhece, Von Trier é um dos mais geniais diretores da atual safra. Responsável por obras complexas, fortes e, principalmente, reflexivas. Mas reflexivas não no sentido individual, e sim no geral, nos faz pensar como sociedade, talvez por isso seus filmes recebam críticas tão duras e às vezes são ignorados pelo grande público. Mas o que seria do cinema se não houvesse o “pequeno público”: homens aranhas e comédias pastelões? Adam Sandler ao invés de Robert de Niro? Anna Faris no lugar de Susan Sarandon?



Lars Von Trier é o criador do “Dogma 95”, uma espécie de cartilha em que um conjunto de regras determina como deve ser criado um filme, entre elas: ausência de cenário, utilização de som e iluminação naturais, câmera de mão. Opõe-se a idéia de autor, de cinema individual e efeitos especiais. Parece loucura, eu sei. Porém, Dogville não pode ser considerado uma obra que segue genuinamente os precedentes desse movimento dinamarquês, já que utiliza iluminação artificial, existe diretor de fotografia, entre outras coisas, mas o radicalismo de Dogville lembra algumas ousadas experiências do movimento.

A intenção do diretor era criar uma trilogia sobre os Estados Unidos (a segunda parte inclusive já foi lançada com o título “Manderlay”). Curiosamente, Lars Von Trier nunca esteve nos Estados Unidos e é sempre rotulado como um anti-americano. Por isso, seus filmes nunca obtiveram sucesso em território americano.



Mas vamos ao que interessa.

Dogville é uma cidade no meio das montanhas dos Estados Unidos e que possui um pouco mais de 15 habitantes(você não entendeu errado, são 15 habitantes). A história se passa durante a Grande Depressão americana na década de 1930 e gira em torno de Grace (Nicole Kidman, linda e num dos melhores papéis de sua carreira, a conhecida "belle epoque" da atriz), uma mulher que está fugindo de gângsteres e encontra abrigo em Dogville. Calma, não entenda esse abrigo tão ao pé da letra assim.

Encantado com a moça, o jovem Tom (Paul Bettany) propõe aos moradores que Dogville sirva de refúgio para Grace que, em troca, faria pequenos serviços a comunidade (já que a população estava temerosa com a possibilidade do aparecimento dos gangsteres na minúscula cidade) e através de um plebiscito, os moradores aprovam a permanência de Grace entre eles. Só que o negócio começa a ficar sério e a polícia começa a bater às portas de Dogville atrás de Grace (no final do filme você entenderá porque a polícia), e a população, que até então tinha se mostrado amorosa para com a jovem, começa a explorá-la cada vez mais, para que assim eles pudessem escondê-la. Inicia-se um misto de chantagem e interesse em cima de Grace.

Grace faz de tudo na cidade, desde dar aulas na escola e trabalhar no cultivo das maçãs até satisfazer um velho sexualmente. Exploração parece uma palavra amena perto do que essa mulher sofre, porque além de tudo isso ela tem que se preocupar em fugir de quem a persegue fora dali. Escravidão define melhor a condição de Grace, ela se torna prisioneira da cidade e passa a usar correntes após sua primeira tentativa de fuga.



Quando disse no começo do post em DESAFIAR CONVENÇÕES, estou me referindo principalmente ao cenário do filme, que, aliás, não existe. Todo o espaço que representa a cidade é marcado com giz no chão, delimitando as casas, a Igreja, as macieiras e todo o resto. Minimalista, o diretor só fez uso de alguns objetos de cena, a ausência de cenários permite que o espectador veja os coadjuvantes em suas práticas rotineiras e totalmente desfocados da cena principal que ocorre no primeiro plano da imagem. Isso é magnífico e dá um grau de complexidade absurdo ao filme, pois atentar aos codjuvantes fora da cena é essencial ao entendimento da obra

Tirando o cenário do foco, o diretor conseguiu que o espectador prestasse atenção naquilo que ele realmente quer mostrar no filme: “a desumanidade que brota da humanidade”.



Os coadjuvantes do filme representam essa tal desumanidade, exclui-se daí apenas o personagem de Paul Bettany, que apesar de DIZER amar Grace, ele é um homem passivo e frouxo, de discursos vagos e metido a intelectual, que não consegue enfrentar os moradores em prol da "amada". É aqui que a esperança que Grace tinha na humanidade começa a se esfacelar, já que Tom é o único ser humano que ela confia. Eu particularmente achei Tom o personagem mais interessante da obra, tem nuances de aproveitador sexual barato que se mesclam com um gênio introvertido. O resto do time de coadjuvantes (brilhantes por sinal: Stellan Skarsgaard, Lauren Baccall, Patricia Clarkson, Philip Baker Hall e Chloe Sevigny) representam o sofrimento de Grace, que vão desde orgulho, avareza, vaidade, preguiça, luxúria e inveja.
O que Grace vive é uma verdadeira Odisséia. Nicole Kidman é sofrimento a flor da pele. É lindo de ver ela trabalhando tão bem.

O filme é uma crítica ferrenha à sociedade estadunidense. Uma crítica a essa potência que o ser humano tem em ser vil, hipócrita e mesquinho, um individualista conservador e possessivo. Lars Von Trier costura isso de maneira tão perfeita que resta-nos apenas o recolhimento e a reflexão (provavelmente) negativa do que é a sociedade. No final do filme essa crítica fica mais clara a partir da música de David Bowie e das decisões tomadas por Grace, que culminam num final trágico.



O filme é sublime. Não só por inovar, quebrar convenções, mas por tratar de um tema tão complicado (às vezes parece que estão apontando um dedo na nossa cara, mesmo que de forma branda) de uma maneira bem natural. Os atores tiveram que se esforçar e dar o máximo de seu potencial, pois gravaram todas as cenas em cima de um tablado, ou seja, exigia experiência em teatro.



Quanto vale a minha dignidade? QUANTO VALE A DIGNIDADE DO PRÓXIMO?

Lars Von Trier apresenta uma percepção da sociedade onde impera o cinismo, a mentira e a naturalização da maldade. E acima de tudo consegue manter nossas cabeças ocupadas por um bom tempo após o filme.

Dogville é uma síntese espetacular da humanidade frente aos seus objetivos, percepções e interesses.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Ventos da Liberdade (Crítica: Na Natureza Selvagem / 2008)




A felicidade só é verdadeira se for compartilhada.
(Christopher McCandless)

Sean Penn é para mim um dos melhores atores ainda em exercício na profissão. Entende do que faz, e além de tudo, trilha caminhos complexos e improváveis dentro da carreira. É com todo esse mérito que esse cara resolveu navegar por águas diferentes, tortuosas e, assim, mostrar também seu enorme talento como diretor e roteirista.

Dos poucos filmes que dirigiu, sem dúvida, Na Natureza Selvagem (Into the Wild, 2008. EUA) é o que mais se destaca. Não é um filme fácil de resenhar, nem mesmo de discutir numa roda de amigos, mesmo que bêbados. A história pode ser simples, mas tudo o que acarreta e todas as motivações dela são incertas, confusas e podem gerar atrito de opiniões. Por mais que você não concorde com os motivos, não há como discordar da beleza dessa obra.



Na Natureza Selvagem é adaptado do livro de Jon Krakauer (recebe o mesmo título), que conta a história de Chris McCandless, um jovem de 22 anos, que após a faculdade larga tudo para viver uma aventura pelos Estados Unidos. Talvez a palavra “aventura” não caia bem ao que o filme propõe, mas no fim é isso: uma aventura, tanto exterior quanto interior.

McCandless fazia parte simplesmente da nata norte-americana. Vem de família rica, sempre estudou nos melhores colégios e tinha acabado de se formar na faculdade, ou seja, ele estava com a vida encaminhada. Mas estava faltando alguma coisa. Chris larga tudo (reprovado pelos pais) e resolve atravessar boa parte do país para tentar viver durante um tempo no Alasca, o lugar que ele supunha ser o mais selvagem de todos, onde a natureza exalaria sua essência mais pura. Com apenas uma mochila, alguns pertences e pouco dinheiro o jovem parte com destino à sua “aventura”.

Durante sua jornada de dois anos, Chris liberta-se da sua própria identidade e assume um novo nome: Alexander Supertramp, que ele vai deixando marcado, entalhado por todo lugar que passa. Ele queria ser parte daquela natureza. Ele queria esquecer o que ele foi.




30% da beleza do filme está na história e nas atuações de seus coadjuvantes, as pessoas que Alex (agora o chamarei pelos dois nomes) vai conhecendo durante o trajeto até o Alasca. Seja o casal de hippies que lhe deu carona, onde ele estabelece com a personagem de Catherine Keener uma relação de cumplicidade que até então ele nunca havia conseguido estabelecer com seus pais. Ou o picareta vivido pelo comediante Vince Vaughn (extremamente carismático). Em todos seus encontros, Alex terá suas conclusões e definições sobre o que são relações humanas contestadas. Cada encontro é uma nova aquisição, tanto para ele quanto para quem ele encontra no caminho.



Aqui entram os motivos pelos quais Alex resolveu deixar sua casa. Alex está cansado de todo o consumismo que o cerca, da sociedade pós-moderna e suas futilidades e crenças e desacreditado do potencial humano em amar e preservar, sejam sentimentos ou até mesmo a natureza, que é onde ele vai buscar respostas (ou talvez fugir delas), para tentar viver em harmonia com o mundo, com os animais e consigo mesmo. Pode-se dizer que a viagem de Supertramp trata-se de uma auto-descoberta. Supertramp é daqueles caras que os olhos se enchem de lágrima ao ver uma lebre buscando comida, ou cavalos correndo sem rumo. É um amante do sentimento, da vida. É um idealista. Um subversivo da ordem vigente, mesmo que tímido.

O coadjuvante mais estarrecedor é com certeza o veterano Hal Holbrook, que interpreta um veterano de guerra solitário e que praticamente desistiu de viver e através da figura de Supertramp vai conhecer um novo lado da vida: aquele que não existe limitações. É sublime a cena em que o senhor de mais de 80 anos escala uma montanha diante das provocações do jovem Alex já no topo do morro. O filme ainda traz a beleza juvenil de Kristen Stewart, que se apaixona pelo espírito aventureiro do jovem McCandless, e Marcia Gay-Harden e William Hurt, interpretando os pais de McCandless, que são pura emoção.



Os outros 30% se devem ao fato simples (na verdade, nem um pouco simples) do ator Emile Hirsh, intérprete do protagonista, mergulhar no papel e fazê-lo de forma tão visceral e verdadeira. No final da obra, o ator está tão magro, que chega a ser assustador. É fantástico ver tamanha entrega. Foi sim, uma grata surpresa.

10% fica para fotografia da obra, que se destaca muito ao colocar o protagonista em proporções naturais em meio a natureza. Sean Penn quis inserir nas filmagens todos os cartões postais do desconhecido Alasca. As imagens vão de montanhas congeladas e florestas temperadas até desertos.

Os 30% restantes tenho que oferecer a sublime trilha sonora folk do filme. Composta por Eddie Vedder, líder da banda Pearl Jam, a trilha é talvez o melhor do filme, pois ela embala cada momento de solidão do protagonista com tanta precisão que chega a arrepiar. É genial e essencial para o entendimento do personagem.

A estrutura narrativa do filme também é sensacional. O filme é cortado por narrações da irmã de McCandless (Jena Malone), que é o que dá base para voltar no passado do protagonista, junto com isso vem a divisão da obra em capítulos: como por exemplo quando Chris decidi dar início a sua aventura, o capítulo é “Nascimento”, e quando chega ao auge de sua aventura chama-se “Sabedoria”, já como Supertramp. O diretor alterna flashbacks da vida do protagonista com cenas da aventura no Alasca (onde estão as melhores cenas de Hirsh, principalmente dentro do "ônibus mágico") promovendo um verdadeiro show de técnicas cinematográficas.



Esse é Christopher McCandless, um cara que realmente existiu e que não conseguia viver no meio de regras impostas, numa família infeliz e hipócrita. E o mérito do filme é esse, conseguir mostrar que o protagonista vai além de um mero maluco anti-social, e isso se dá graças às relações que o protagonista foi criando ao longo de sua jornada, dando profundidade ao personagem.

O filme apresenta uma história verídica, comovente e que gera muita reflexão sobre o quanto podemos levar uma vida insignificante se não soubermos como vivê-la. Muitos enxergam Chris McCandless como um herói, mas é irônico que um herói tenha que ter um fim tão trágico principalmente por se tratar de um jovem que seguia seus princípios morais e tinha uma paixão imensurável pela vida.

E Chris só estava em busca dele mesmo.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Anjo Mau (Crítica: O Leitor / 2008)



"Não importa o que eu penso, não importa o que eu sinto. Os mortos continuarão mortos" (Hanna Schmitz).

Fantástico. Com uma única palavra eu consigo definir O Leitor (The Reader, 2008. Inglaterra). Filme pesado, complexo, mas acima de tudo edificante, emocionante (no final pesa um pouco no açúcar, mas é o de menos) e que conta uma história diferente de tudo que eu já vi.



O diretor e roteirista inglês Stephen Daldry é conhecido por trabalhar em pouquíssimas produções, essa é apenas a terceira da carreira dele de pelo menos quinze anos. Porém, cada vez que ele pega num papel pra escrever um roteiro saem histórias sublimes, como é o caso de Billy Elliot (2001) e As Horas (2002). E não é diferente com esse. O diretor escolhe seus atores a dedo e faz uma produção invejável, com fotografia, trilha sonora e montagem de cair o queixo. Talvez ele precise desse tempo mesmo (6 anos) pra rodar um próximo trabalho, por que o que resulta é de aplaudir de pé.

O roteiro é baseado num livro curto (235 páginas), escrito por um autor alemão e tem como fundo uma história de amor entre um menino de 15 anos e uma mulher de 35 que se apaixonam durante o Holocausto, pra quem não conhece, o Holocausto seria a Segunda Guerra Mundial. A produção começou com uma série de problemas, primeiramente, Nicole Kidman tinha sido escalada pra viver o papel de Hanna Schmitz e por uma série de contravenções teve que ser substituída por Kate Winslet (convenhamos que o filme só ganhou). Mais tarde, o filme chega ao cinema como vilão, pois foi ele quem tirou de Batman - O Cavaleiro das Trevas a vaga para concorrer a Melhor Filme no Oscar de 2009.



Superada todas essas questões, voltemos a obra (que definitivamente não pode nem deve ser esquecida).

Em Meados dos anos 30, o jovem Michael Berg, interpretado pelo alemão e iniciante David Kross, inicia um romance com uma mulher mais velha (Hanna Schimitz). O jovem se encanta pela mulher misteriosa e por toda sua experiência, e Hanna (que até então não sabemos do seu problema) se encanta com o poder da leitura que o menino tem. Detalhe: ele apenas sabe ler. O que acontece são descobertas diferentes para os dois, para ele, a iniciação na vida sexual e para ela, a literatura. Isso é o que o filme tem de mais puro e bonito: girar em torno de uma história tão simples e real. Então toda a prática sexual é intercalada por momentos de leitura, em que o menino anestesiado pela paixão lê para a mulher dura e reclusa, apaixonada por histórias que é Hanna. Repare em Hanna durante as leituras. Ela some, viaja para outro mundo, é arrepiante. (Garantindo lindas cenas para o currículo da atriz Kate Winslet).

Porém, esse romance só dura um verão, já que Hanna some no mundo sem deixar pistas e Michael, desolado, tenta seguir sua vida. Anos mais tarde, como estudante de Direito, Michael vai assistir a um julgamento de crimes de guerra, e quando chega no tribunal dá de cara com Hanna no banco dos réus. Hanna é acusada de matar centenas de mulheres durante a Segunda Guerra, quando esta foi guarda da SS, grupo ligado às forças nazistas. Nas cenas do julgamento, Kate Winslet praticamente não abre a boca, mas diz tudo com os olhos. A gente enxerga ela pensando: “Mas o que eu estou fazendo aqui? Eu apenas cumpria a lei”. São lindas cenas também, e que promovem reação de compaixão do espectador para com a personagem, pois enxergamos nela a essência de uma mulher ignorante, controladora, determinada e sem limites. Até que ponto a ignorância pode ser usada como desculpa? Pois é! É incrível como a gente passa a torcer pra que Michael abra a boca e defenda Hanna durante o julgamento, numa hora que ela está sendo acusada de escrever uma carta e que só você e ele sabem que não foi ela quem escreveu (a segunda cena mais linda do filme). A cena mais linda do filme fica por conta de Kate Winslet mais uma vez, já na prisão, velha, ela dá início a um processo de (eu não posso contar!! hehe). Mas enfim, é a cena mais terna do filme, é lindo demais mesmo.



Queria eu poder pegar na mão de Kate Winslet e dizer MUITO OBRIGADO como fez Marion Cottillard no dia em que entregou o Oscar de Melhor Atriz em suas mãos. Kate Winslet usa das técnicas que vem aprendendo desde o longínquo Razão e Sensibilidade (1995). Desde lá, só entrega interpretações memoráveis, em que ela doa todo o seu corpo pra viver a personagem que for, não tem medo de nudez, de parecer velha, de nada. É atriz mesmo. O novato David Kross também não faz feio, só de não atrapalhar Kate em cena ele já estava fazendo grande coisa. O único que talvez esteja um pouco fora de sintonia seja o ator galês Ralph Fiennes (interpreta Michael Berg mais velho), mas também não chega a prejudicar tanto, já que Winslet eclipsa qualquer movimento do ator.



Outra coisa que deve ser lembrada, é que o filme não foca no Holocausto, mas só usa essa fase da história mundial como cenário, pano de fundo de outra história. E também o grande uso do silêncio por parte do diretor, o que pra mim, enriquece em muito a obra. (ps: é aquele tipo de silêncio que diz tudo).



Por fim, O Leitor faz o espectador pensar, refletir aquilo que eu já disse anteriormente. Até que ponto a ignorância justifica um erro? Se justifica algum, então dependeria do erro?

No final das contas, o que importa é o que fazemos e não o que sentimos.

sábado, 7 de maio de 2011

A Insustentável Estranheza do Ser. (Crítica: Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças / 2004)




"Feliz é o destino do inocente, esquecido pelo mundo que ele esqueceu." Alexander Pope


Sempre fui amante dos filmes dramáticos, edificantes e até mesmo os trágicos. Aqueles filmes que te dão margem à reflexão, que te fazem crescer como ser humano e que mostram a capacidade do Homem em tocar o coração do espectador. É isso o que acontece nesse Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças (Eternal Sunshine of the Spotless Mind, 2004. EUA) do diretor Michel Gondry e do roteirista Charlie Kauffman.

Para quem não conhece, Kauffman é responsável por escrever os roteiros mais inusitados do mercado cinematográfico e que sempre gera ótimos filmes, como Quero ser John Malkovich (1999) e Adaptação (2003). Mas nessa obra ele se supera, escreve uma história linda de amor (mas precisamente de problemas de relacionamento) , paixão, ciência (embora insana) e coragem.



O filme, devo confessar, não vai agradar logo de cara por uma série de motivos. Um deles é a história, que se não for apreciada com olhos de criança não vai ser entendida e nem contemplada. O outro é o simples fato de escolherem Jim Carrey para protagonizar esse drama, nem de longe ele faz feio. Não. O problema é que um ator extremamente repleto de estereótipos pode causar algum tipo de pré-conceito no possível espectador. Eu digo que não, se houver males no filme ( que eu acho que não há) Jim Carrey é o menor. E, por fim, a falta de linearidade da narrativa (o filme não é fácil de entender), que pode tornar a experiência de ver o filme um pouco confusa, talvez precise ser assistido mais de uma vez.



Mas vamos à história.

Se você pudesse apagar da sua memória todos os sofrimentos e lembranças tristes que você guarda desde os primórdios de sua vida, você apagaria? Você acha que seria a pessoa que é hoje se não tivesse passado por todas as peças que a vida lhe pregou? Afinal, é muito mais fácil esquecer, como se não tivesse vivido àqueles momentos ruins do que tentar vencer esses obstáculos.

Basicamente, a história do filme é essa. Joel ( Jim Carrey) e Clementine (Kate Winslet, sempre ótima e indicada ao Oscar de Melhor Atriz pelo papel) possuem uma história de amor que começa a enfrentar uma crise, por isso, ela resolve apagá-lo da memória através de um procedimento médico criado pelo Doutor Howard (Tom Wilkinson). Ao descobrir que Clementine fez o procedimento, Joel, para se vingar, resolve fazer o mesmo. E aí vem o desenrolar da trama. No decorrer do procedimento, que leva algum tempo, Joel percebe que não quer apagar Clementine da sua memória, mas pelo contrário, ele quer manter acesa todas as lembranças felizes que ele teve com a mulher. Assim, o filme parece ser bem simples, mas apoiado no roteiro fabuloso de Kauffman e na brilhante montagem da obra, o filme tem um desenrolar incrível. Joel querendo salvar Clementine do possível “deletamento” começa a criar lugares dentro de sua mente e a levá-la esses lugares, que na verdade, ela nunca esteve. Aqui percebe-se que Joel está lutando inconscientemente, enquanto o procedimento de esquecimento está sendo feito.



Mas toda essa aparente estranheza só enriquece o filme, quem prestar bem atenção verá que tudo se encaixa maravilhosamente bem, todas as aventuras de Joel dentro da sua mente: a volta a infância, os diálogos (incríveis) entre ele e Clementine , os momentos bons e os momentos ruins da relação. Tudo isso faz a gente torcer para o casal, pra que nenhum esqueça o outro, pra que eles enxerguem que se amam. Isso torna o filma terno, tocante, pois sabemos que aquilo ali não é nada mais nem menos que nossa vida.

Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças é isso, um romance triste e feliz, uma grande reflexão sobre escolhas e destinos da vida. Inesperadamente, na hora do desespero a gente pode optar por apagar alguém da nossa mente, mas isso não significa que a gente não ame essa pessoa. É só mais fácil, menos doloroso.

É angustiante tudo o que sofre o personagem de Jim Carrey, a gente segue seus passos no filme, sorri para a tela no momento em que achamos que tudo vai dar certo, choramos quando achamos que tudo vai dar errado. Às vezes parecem duas crianças ingênuas. O pior de tudo é perceber o amor e achar que este está se esvaindo quando Joel não encontra Clementine em certo lugar.
Descobrimos que torcemos pelo amor.



É um daqueles filmes estranhos, mas que encantam e conquistam talvez pela estranheza do roteiro, dos personagens (cada hora Clementine aparece com uma cor de cabelo diferente: azul, verde), pela história que ao mesmo tempo que é irreal se torna tão real pra quem assiste.

No fundo, é aquela história que a gente já está cansado de saber: é melhor viver intensamente, do que simplesmente passar pela vida. Merece ser visto, pois trata-se de um grande filme.



Dedico esse post a melhor estranha que já conheci, mas agora ela "tá" na Oca dela.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

A Eterna Bonequinha de Luxo (Biografia: Audrey Hepburn)

Seu coração se parte, é só isso.



O primeiro post de astro da semana tinha que ser bem interessante. Primeiro, uma estrela que merecesse por sua história de vida tanto pessoal como profissional e que assim, em segundo, tivesse se tornado um mito. Seguindo não só esses parâmetros, mas também pedidos, a estrela da semana é Audrey Hepburn.

Por coincidência, no último dia 04 de maio Audrey estaria completando 82 anos, então também pode-se tratar de uma singela homenagem a essa brilhante atriz.

Poucos atores, diretores e seja lá qual for a área em que o sujeito atue podem receber a alcunha de ESTRELA. HEPBURN É UMA DAS QUE PODEM SER CONSIDERADAS UMA FIGURA ESTELAR.



Nascida em 1993 na Bélgica, Audrey era de família riquíssima, o pai banqueiro e a mãe uma baronesa holandesa. Foi após o divórcio dos pais que Audrey foi morar em Londres e lá iniciou seus estudos em arte dramática e balé. A futura bonequinha de luxo também tem toda uma história de humanismo: participou do combate as forças nazistas durante a Segunda Guerra Mundial e também defendeu de forma perseverante às crianças durante as décadas de 70 e 80.

Até então, Audrey era desconhecida do grande público. Até que quando voltou de uma viagem com a mãe ela resolveu se tornar modelo. A fase de modelo não duraria muito, pois pouco tempo depois foi descoberta por um produtor de cinema. E aí então o mundo conheceria Audrey, conheceria seu talento, sua beleza. Audrey estava pronta para o ESTRELATO.

Antes de seu primeiro filme de sucesso A Princesa e o Plebeu (1953), Audrey participou de uma série de filmes britânicos e franceses, mas é com essa obra norte-americana em que ela se junta ao brilhante Gregory Peck que a atriz vai mostrar o que ela realmente é. Senão fosse Audrey, o filme poderia ter se tornado um porre. Mas não, ela é alma do filme. O papel da princesa Ann lhe rendeu o Oscar de Melhor Atriz daquele ano. Para mim, o melhor da sua carreira.



Pronto, a carreira de Audrey Hepburn estava eclipsada, mas seu talento ainda não havia sido confirmado, mas a confirmação veio. Em seguida, a atriz filmou Sabrina (1954) e Uma Cruz à beira do Abismo (1959), os quias lhe renderam novamente indicações ao Oscar. Audrey nunca mais viria a ganhar o Oscar, mas continuaria dando provas de seu enorme talento.

Em 1961, Audrey filma talvez o filme da sua vida, aquele que seria sua marca registrada nos dias de hoje: Breakfast at Tiffany’s, que no Brasil foi traduzido para Bonequinha de Luxo. Essa comédia dirigida pelo gênio Blake Edwards rendeu novamente uma indicação ao Oscar para Audrey, mas aí ela perdeu injustamente para Julie Andrews (Mary Poppins). Nessa obra, Audrey Hepburn é Holly Golightly, uma mulher corajosa, que enfrentou dramas familiares muito cedo e casou com um homem muito mais velho por isso. Até que ela decide largá-lo e tentar a vida na cidade grande. A partir desse ponto, a meta de Holly é conquistar um milionário que lhe dê conforto e uma vida regrada de luxo, representado pelos diamantes que ela vê na vitrine da Tiffany’s. Torna-se então a prostituta de luxo de Manhattan. O filme é baseado num livro de Truman Capote. E Audrey dispensa comentários, está radiante, roubando todas as cenas. Lembre (se você assistiu) a linda cena em que ela está na janela e canta Moon River, música feita especialmente para ela.



Depois de Bonequinha de Luxo, Hepburn vai ter poucos filmes de destaque, de forma paulatina ela vai se distanciando do cinema. O que merece ser lembrado aqui é My Fair Lady (1964) e Um Clarão nas Trevas (1967), em que Audrey, nos dois filmes, entrega interpretações avassaladoras.

Entre a década de 70 e 80, a atriz se envolve em pouquíssimos projetos cinematográficos. Mas, por outro lado, iniciou um belíssimo trabalho como Embaixadora da UNICEF de ajuda às crianças de países pobres. Visitou uma série de países como Sudão, Etiópia e Tailândia.

Audrey seguiu assim, até o dia de sua morte em janeiro de 1993, após ter diagnosticado um câncer um tempo antes.



Assim era Audrey, conquistava na tela, no olhar, na fala, na delicadeza, na solidariedade. É por esses motivos e outros que nossa geração está mais pobre, pois faltam pessoas que possam realmente receber a alcunha de ESTRELA. E Audrey é, sem dúvida, uma dessas pessoas que podem ser chamadas de METEORO.



FILMOGRAFIA OBRIGATÓRIA

A Princesa e o Plebeu – 1953
Sabrina – 1954
Uma cruz à beira do abismo – 1959
O Passado não perdoa – 1960
Bonequinha de Luxo – 1961
Infâmia – 1961
Quando Paris Alucina - 1964
My Fair Lady – 1964
Um Caminho para dois – 1967
Um Clarão nas Trevas - 1967

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Realidade Real (Crítica: O Discurso do Rei / 2010)



COMPLICADÍSSIMO falar de O Discurso do Rei (The King’s Speech, Inglaterra.2010). Pra você ter noção essa é a última frase da resenha que eu estou escrevendo. Na minha opinião não passa de um filme correto com grandes interpretações.Acabaria aqui então a crítica? Não. Pra tentar desvendar o que é esse filme, vou ter que falar de diretor, atores, roteiro e história, principalmente história, e talvez tenha sido ela quem encantou a Academia Hollywoodiana e vem encantando tantos outros críticos de cinema ao redor do mundo.



Primeiro de tudo: ROTEIRO. O Discurso do Rei tem um roteiro original escrito pelo pouco conhecido David Seidler, que conta o que sofreu o Rei George VI (Colin Firth) para conseguir ganhar a confiança do povo britânico nos primórdios da Segunda Grande Guerra. Detalhe: para quem não sabe o rei era gago, e não conseguia sequer fazer um pronunciamento para seus súditos. O roteiro do filme vem todo amarrado, perfeito, como se tivesse sido contado cada minuto de filme numa folha de papel. Esse é o grande trunfo do filme.



Segundo: Atores. Esses merecem ser citados um por um. Começo pelo gênio Colin Firth (de longe, na melhor fase da sua carreira), que faz um rei absurdamente irreal (em nosso ideário), um rei que mostra seus medos , sua fragilidade e até se tornar aquele rei, que simplesmente consegue falar. Você não precisa entender o que fala o personagem pra sentir o medo que exala dele, basta olhar nos seus olhos. Agora, Helena Bonham-Carter, a estranha mulher do diretor Tim Burton (Alice, Ed Wood, Edward: Mãos de Tesoura) representa toda a força e solidariedade do filme no papel da futura Rainha Elizabeth, mãe da atual. E pra terminar, pelo menos para mim a atuação mais surpreendente da obra, aquele feiosão do Geoffrey Rush. Esse ator australiano, além de tudo produtor do filme, faz o fonoaudiólogo que vai ajudar o rei a curar à sua gagueira, e toda sua pertinência e profissionalismo perante a figura real chega a ser um pouco emocionante, um pouco.

O filme não emociona.



E é aí que entra a figura do praticamente estreante diretor Tom Hooper. A história é muita retilínea, segue cada passo das práticas cinematográficas, em nenhum momento perde a mão com a direção. Mas será que perfeição, significa emoção? Eu acho que não. Foi como se eu tivesse assistido a um documentário da vida de um rei num canal pago qualquer. O filme é bom, só que peca em coisas simples, em frieza (inglês), em exageros técnicos e numa história que poderia ser menos bobinha. Para mim, cinema é muito mais do que isso.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

O Último Ato (Crítica: Cisne Negro / 2010)



Nas últimas semanas estive pensando o que seria mais viável: falar sobre um filme ótimo, mas que já saiu do cinema, ou falar de um filme mediano que ainda está em cartaz – assim, vocês teriam a oportunidade de conferir o filme em tela grande. Optei por seguir os indícios novamente, ainda mais quando se tem uma amiga bailarina, daí não dá pra fugir.

Assim, caiu Cisne Negro (Black Swan, 2010 – EUA) na minha mão, não que seja um desprazer falar desse filme, muito pelo contrário, é uma obra de gênio.



O diretor Darren Aronofsky é um dos poucos diretores que conseguem envolver o telespectador de forma tão visceral e apaixonante, que consegue introduzir aos personagens uma verdade imensurável, que faz a gente pensar que aquilo é simplesmente um reality show. Aronofsky é simplesmente diretor de Pi (1998), Réquiem para um sonho (2000) e O Lutador (2008). De filmografia pequena, mas de excelente qualidade.



Cisne Negro é um drama sobre perfeição, paranóia e projeção e principalmente amor, amor pela arte, no caso, amor pelo balé. Natalie Portman (linda e absurdamente fantástica) é Nina, uma bailarina de 28 anos que nunca teve um papel de destaque na companhia em que dança. Até que chega seu momento, quando o diretor do estúdio (vivido pelo francês Vincent Cassel) decide remontar “O Lago dos Cisnes” de Tchaikovsky. Logo de cara o diretor enxerga em Nina o lado frágil necessário para viver o Cisne Branco, mas não o sedutor e arrebatador para viver o Cisne Negro. Só que Nina tem uma série de questões mal resolvidas. Ela ainda é tratada como uma criança dentro da sua casa. A mãe (vivida pela ótima e sumida Barbara Hershey) é uma ex-bailarina frustrada que exerce uma pressão sobre-humana sobre Nina, percebe-se aí uma relação sadomasoquista entre mãe e filha, uma relação que esfacela ao longo do filme.

Engana-se quem acha que o filme é sobre balé. Não é. O filme aborda o esforço e tudo o que renega uma mulher para se tornar uma bailarina perfeita. No contexto do filme, seria a busca incessante que Nina faz dentro de si própria, átras de uma mulher sexual, soberba, do CISNE NEGRO. Até onde pode ir um ser humano para se tornar perfeito. E a resposta é simples, o ser humano ultrapassa o limite da sanidade. E é aqui que o filme ganha o que ele tem de melhor. Aronofsky junto com a brilhante atuação de Natalie Portman consegue transformar um drama de balé num triller psicológico daqueles de roer unha mesmo, de fechar os olhos em algumas cenas e de constranger-se numa reveladora transa lésbica. O filme não se fez só de diretores e de ótimos atores, mas também de maquiagem (sublime), fotografia e uma montagem espetacular.



O longa tem sim vários clichês da vida de uma bailarina, mas tem também um final surpreendente que compensa todos os lugares comuns que a obra apresenta. Natalie Portman mais uma vez dá um belíssimo show e mostra ser a atriz mais talentosa de sua geração (a mesma que traz Anne Hathaway, Reese Witherspoon e Charlize Theron), não é a toa que ela ganhou todos os prêmios de Melhor Atriz do último circuito de festivais, inclusive o Oscar. É filme pra ter na cabeceira da cama.