quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Zombie (Crítica: The Walking Dead)



Finalmente chegou a vez da exceção: uma resenha crítica de uma série americana. Confesso que tenho bastante repulsa de séries televisivas feitas na terra do Tio Sam, talvez por ter que esperar por casa episódio, talvez por se basearem em roteiros fracos, talvez por escolher um elenco caricato, enfim (tiram-se desse bolo alguns bons atores que surgiram com séries, como é o caso do canastrão George Clooney). Então, minha vida se resumia a isso: assistir a séries americanas apenas se me causassem algum tipo de sentimento, ao contrário disso eu não chegava perto dessas produções.



Até que há um mês comecei a ouvir muito sobre The Walking Dead (EUA, 2010). Nos quatro cantos da cidade amigos falando que estavam assistindo a série, que estavam apostando na produção e que adoravam os zumbis. ZUMBIS? Alguém falou em zumbis? Pois é, agora eu posso revelar uma antiga “paixão”. Desde criança tenho fissura por mortos-vivos, acho que é a coisa que mais me dá medo, já que também é dos eventos da ficção o mais provável de acontecer. Entre o céu e a terra existem mais mistérios do que a gente pode imaginar, e nisso, se incluem os zumbis. Não vou ficar aqui falando sobre teorias apocalípticas de como surgiram as lendas de zumbi nem como elas se difundiram no mundo. Aposto na memória visual e na espinha dorsal de cada um. No fim, cheguei até Walking Dead. E posso te falar? Me diverti a beça.

A série é baseada numa HQ de muito sucesso em alguns pontos dos Estados Unidos e foi financiada pela AMC. No Brasil, Walking Dead é transmitido pela Fox. A produção tem seus acertos e um deles é o roteiro bem amarrado. Primeiramente, isso se deve ao envolvimento de Frank Darabont como um dos roteiristas da série. Darabont é diretor de alguns bons e ótimos filmes, como Um Sonho de Liberdade (1994) e À Espera de um Milagre (1999), os dois filmes são baseados em obras do gênio do terror Stephen King. Com Darabont circulando pela produção da série, já podíamos esperar grande qualidade no desenvolvimento da história. E não foi diferente.



Mesmo que adaptada de uma história em quadrinho, a adaptação para a televisão exigia mudanças na história original (alguns insistem que os quadrinhos são melhores). O grupo de pessoas que é centralizado dentro da história foi mantido, como algumas das tramas e outros detalhes menos importantes.

Rick Grames (Andrew Lincoln) é um policial que num certo dia do trabalho é baleado gravemente e entra em coma. Algum tempo depois, Grames desperta do coma e se depara com o mundo totalmente diferente. Os mortos se levantaram e estão matando todos os seres humanos. Como sabemos, todo humano mordido por um morto-vivo se torna um zumbi, e isso se torna um ciclo sem fim, até que todos os humanos se tornem mortos-vivos. Grames é o protagonista, que é acompanhado de perto por outros dois grandes papéis: Lori (Sarah Wayne Callies), mulher de Grames, e Shane (Jon Bernthal), o melhor amigo de Rick, também policial, que mantém um caso com Lori, quando da ausência do marido.



Quando Rick sai do hospital, encontra a cidade devastada, com milhares de zumbis vagando pelas ruas, sedentos por carne fresca. Rick, totalmente desorientado, sai em busca da mulher e do filho Carl (Chandler Riggs), que provavelmente num acesso de desespero fugiram da cidade. Basicamente, a história vai se desenrolar de forma surpreendente. Lori acreditando que o marido está morto vai fugir com Shane e é quando se forma o grupo principal da série: Andrea (Laurie Holden), Dale (Jeffrey DeMunn), Glenn (Steven Yeun), Carol (Melissa McBride), Sophia (Madison Lintz), T-Dog (Irone Singleton) e Daryl (Norman Reedus). Durante a primeira temporada alguns outros personagens se juntaram ao grupo, mas terão vida curta no que diz respeito ao segmento da obra. Porém, a história desse grupo só começa a ser mostrada ao espectador quando Rick finalmente os encontra após passar por um tremendo sufoco em Atlanta, onde encontrará alguns integrantes do grupo em missão.

No que tange à qualidade da série, uma crítica construtiva seria inegável e bem aceita em alguns pontos, como é o caso da escolha dos atores e, às vezes, a cansativa reviravolta do roteiro. Quanto ao roteiro, que sim, é muito bom, existem algumas falhas bobas, como por exemplo, a necessidade de dramatizar os personagens o tempo todo, levando a produção para um caminho parecido com Lost, confuso e desnecessário, mas que, no fim das contas, consegue voltar a respirar ares límpidos. Não que a humanização das personagens não seja importante, sem dúvida é. Mas não pode ser esquecido o principal motivo pelo qual eles estão ali: os zumbis, e por muitas vezes, eles acabam sendo deixados num segundo plano (na primeira temporada nem tanto, isso ocorre mais na segunda). Na minha concepção, os zumbis são os protagonistas, são as máquinas da série.



Segundo ponto, que acho que acontece muito pela dramatização do grupo, é a falta de carisma das personagens. Alguns não possuem carisma nenhum mesmo (vide os a maior parte do grupo) e outros são ruins mesmo, como é o caso de Andrew Lincoln e Jon Bernthal. Talvez pela pouca experiência com trabalhos fora da televisão, os dois atores pecam muito nas expressões faciais, nos olhares vagos, na cabeça que se mexe descontroladamente, no choro contido, no machismo latente e, principalmente, na fala dura. Parece que eles querem imitar alguém e não parecem à vontade em nenhum segundo da trama. Outros personagens sofrem com a falta de carisma, como Lori, Andrea e Carl. Talvez o maior achado seja realmente o jovem asiático Glenn, interpretado com tranqüilidade por Steven Yeun, e um pouco atrás vem o durão Daryl, que também não deixa a peteca cair.



O ápice da trama como todos já devem imaginar são os zumbis. Agressivos em todo o seu “debilóidismo” na forma de andar, de rosnar, eles são um capítulo a parte da produção. Realmente grandiosa, a obra consegue juntar uma multidão de mortos-vivos, em que podemos encontrar um zumbi mais assustador que o outro. E NUNCA, nunca um se parece com o outro. O trabalho da maquiagem da série é fantástico e provavelmente deve ter angariado muitos prêmios ao redor dos Estados Unidos.



A série é pura diversão. Mesmo que mexa com alguns temas que possam levar a discussões de gênero, sanidade, isso se torna muito superficial. À medida que os diretores tentam aprofundar esse tipo de discussão edificante, a série vai perdendo a qualidade, pois se torna laxativa e mórbida e acaba perdendo seu real sentido. Que venham as próximas temporadas dessa série que vem revolucionando a forma de se fazer televisão. Televisão com cara de Cinema.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Legítima Aborígene (Biografia: Nicole Kidman)

Não há drogas, nem Tom num traje, nem psiquiatras.



Os astros de Hollywood pagam um preço pra se manter visível aos projetos e iniciativas do Cinema, às vezes alto, outras vezes nem tanto. Geralmente, astros em decadência já possuem seu Oscar e sua grande atuação, então, são acometidos pela chamada “Maldição do Oscar”. Halle Berry é um exemplo fortíssimo do que eu quero dizer, após vencer o Oscar de 2002 (que nem foi tão merecido assim), a atriz nunca mais conseguiu se incluir num projeto com visibilidade, ou que lhe trouxesse alguns elogios da crítica especializada. Quem estava na mesma situação até alguns meses atrás era a talentosíssima e subestimada Nicole Kidman, que após ser premiada pela Academia, em 2003, a atriz só conseguiu sair da chamada maldição oito anos depois.

Por ser uma atriz pela qual tenho grande afeição, eu consegui acompanhar essa fase bastante conturbada na carreira de Kidman. A crítica não estava sendo rude, realmente, a atriz tinha dificuldades para se encontrar e estava se saindo medíocre em quase todos os seus papéis. Junto a isso, veio o problema do botox, que ainda persiste. Nicole exagerou na aplicação do produto na região dos olhos e da boca e perdeu quase toda a expressividade, que, sem dúvida, contribuíram para eclipsar sua imagem e carreira.



Ao contrário do que todo mundo pensa, Nicole não é australiana. Apesar de ter sido criada na Austrália, Kidman é norte-americana, nascida no Havaí, em 1967. Seus pais, sim, eram australianos. Aos três anos de idade, Nicole se muda para a Austrália e lá vai viver até começar a investir na carreira de atriz e se mudar novamente para os EUA, no fim da década de 1980.

Aos dez anos, Nicole já mostrava querer seguir a carreira de atriz. Após participar de algumas peças escolares, a jovem atriz começou a participar profissionalmente de algumas peças com mais visibilidade na Austrália. Com quinze anos, Kidman já participava de uma série de televisão. Não demorou muito e a jovem estrela já estava sendo requisitada no Cinema. Dona de uma beleza clássica e estonteante, que era somada com seu enorme talento, a atriz começou a se tornar popular dentro da indústria cinematográfica australiana. Não demoraria muito e Kidman estaria voando de volta para os EUA. O marco inicial de sua carreira mundial veio com dois prêmios de Melhor Atriz do Australian Film Institute, conquistados aos dezenove anos. Foi quando surgiu o convite para estrelar o filme Terror a Bordo (1989), no qual seria esposa do personagem de Sam Neil. A atriz foi aplaudida de pé e recebida de braços abertos pelo público norte-americano.



Morando em Hollywood já, surgiu o segundo trabalho de Kidman: Dias de Trovão (1990), foi nas filmagens dessa obra que Nicole conheceu o galã Tom Cruise, que viria a ser seu marido durante onze anos e que renderia algumas parcerias bastante festejadas dentro da indústria. Nicole Kidman vai até o final dos anos 1990 levando uma característica bastante diferente da atual, durante toda essa década, a atriz vai apostar na sua beleza e fazer filmes de todos os tipos, principalmente os mais comerciais, como Um Sonho Distante (1992) e Batman Eternamente (1995). Kidman vivia à sombra do marido Tom Cruise, o que não impediu que ela começasse a batalhar pela sua carreira. E seu principal papel dessa época, surge exatamente das vésperas do fim de seu casamento. O filme é De Olhos Bem Fechados (1999), no qual contracenou com Cruise (de longe, a melhor parceria). A última obra de Stanley Kubrick, drama psico-sexual, veio para trazer Nicole Kidman para o hall das grandes atrizes.

Do relacionamento com Tom Cruise, Nicole Kidman trouxe, além dos dois filhos, adotados ainda na década de 1990, a alcunha de mulher poderosa. Sim, a atriz que estava fadada a viver na sombra do ex-marido, conseguiu dar a volta por cima e mostrar que poderia montar uma carreira baseada não só na sua beleza, mas também no seu talento nato. E é justamente ao término do casamento, que se inicia a Belle Époque da atriz. A Época de ouro de Nicole Kidman tem cerca de três anos, um prazo curto, mas recheado das mais diferentes entregas que a triz pôde dar, desde uma incrível tradução de Vírginia Woolf até uma atormentada personagem de Lars Von Trier.



O reconhecimento mundial se iniciou em 2001, quando Kidman lança o suspense Os Outros, a primeira indicação ao Oscar viria no mesmo ano. Numa parceria inimaginável e surpreendente entre Nicole Kidman e Baz Luhrmann (diretor do longa), veio o musical Moulin Rouge - Amor em Vermelho (2001). A obra que faz uma releitura luxuosa dos anos de ouro da França, traz Kidman como Satine, dançarina e garota de programa da requisitada casa de shows e prostituição Moulin Rouge. A atriz acabou perdendo o Oscar para Halle Berry, que venceu pela histérica personagem de A Última Ceia (2001).



Alguns fãs fervorosos costumam dizer que Satine é o papel da carreira de Nicole Kidman, eu discordo. Mesmo entendendo a profundidade de Sabine e a importância da personagem na carreira da atriz, não consigo ver nada mais surpreendente do que a caracterização de Vírgina Woolf, pela atriz no filme de Stephen Daldry, As Horas (2002). Nicole está irreconhecível, tanto fisicamente quanto artisticamente, a densidade exigida para o papel até então nunca tinha sido vista quando se tratava de Nicole Kidman. É assustador, arrepiante e arrebatador o que a atriz consegue fazer em poucas cenas, em pensar que ela divide a posição de protagonista da trama com Meryl Streep e Julianne Moore. Pelo papel de As Horas, Nicole Kidman foi agraciada com uma estatueta do Oscar.

Ainda dentro da época de ouro da atriz, surgiram mais alguns importantes papéis, como a sofrida Grace de Dogville (2003) e a corajosa Ada de Cold Mountain (2003). E pode-se dizer que é em Cold Mountain que Nicole começará a descida transloucada de sua carreira. É o último papel em que a atriz vai mostrar sinais daquela época tão festejada pela crítica e pelos fãs. Em 2004, Nicole Kidman lança Mulheres Perfeitas e Reencarnação, produções mal-sucedidas dentro da indústria, mas que até então não tinham prejudicado tanto a solidez de sua carreira. Em 2005, se junta a Sean Penn e roda A Intérprete, que também passa despercebido pelo público. Daí, vem a lama que vai cobrir sua carreira durante cinco anos, e ela se chama A Feiticeira (2005). Nicole estava extasiada com seu Oscar e praticamente não recusava nenhum dos convites feitos para integrar qualquer elenco que fosse. Seu pior erro foi fazer A Feiticeira. Já sentindo todo o peso de não conseguir mais se destacar depois do Oscar, Nicole acreditou que seria uma aposta boa para atrair o olhar do grande público para o seu trabalho. O efeito foi totalmente o contrário, Nicole chafurdou na lama e foi crucificada pela crítica. Foi nesse momento, que surgiu a história da “Maldição do Oscar”. Segundo a crítica, Nicole estava fadada a continuar decepcionando em qualquer um de seus trabalhos e As Horas e Moulin Rouge tinham sido meras exceções de seu trabalho.



Determinada a mudar a visão que acabou criando para si, Nicole começou a apostar em todos os tipos de trabalho, quando devia sentar e analisar cada um deles. Aí veio uma série de erros, como A Pele (2006), cinebiografia da fotógrafa Diane Arbus; Invasores (2007), suspense alienígina de baixíssima qualidade; A Bússola de Ouro (2007), fantasia fracassada, Austrália (2008), considerado a pior atuação da carreira da atriz, o que foi um baque, já que Kidman acreditou que uma nova parceria com Luhrmann pudesse trazer os bons tempos de Sabine de volta e que o filme se tornaria uma homenagem para o país que ela tanto amava; e Nine (2009), do diretor de Chicago (2002), que também passou como um fantasma pelos palcos da indústria. Nicole tentou em todos os campos, foi da comédia aos musicais, do drama aos romances, nada estava surtindo efeito. O único filme que recebeu alguns elogios da crítica foi o pouco conhecido Margot e o Casamento (2007), mas que, mesmo assim, não trouxeram tantas alegrias para o dia a dia da atriz. No mesmo ano ainda, chegou a recusar o papel que rendeu o Oscar para Kate Winslet em O Leitor (2008), quando iria novamente ter a oportunidade de trabalhar com Stephen Daldry.

Durante uma época, Nicole beirou a depressão, foi aí que iniciou as constantes e exageradas aplicações de botox, nessa altura já casada com o cantor country Keith Urban. Kidman chegou a anunciar que ia desistir da carreira em função dos fracassos que se seguiam.



Parece que algumas coisas acontecem por ação divina ou sabe lá o quê. Mas, acredito realmente que alguns papéis foram perfeitos para alguns atores, como é o caso da bailarina Nina de Natalie Portman em Cisne Negro (2010), não tem como imaginar outro ator fazendo. A chance de Nicole Kidman veio com o convite do diretor John Cameron Mitchell, para interpretar uma mãe que acaba de perder o filho num acidente e tenta restabelecer sua vida. O drama que recebeu o nome de Reencontrando a Felicidade (2010), que felicidade não tem nenhuma, rendeu para Nicole Kidman uma nova respirada dentro do mundo do cinema. A atriz foi reconhecida com uma indicação merecidíssima ao Oscar e só perdeu porque concorria com a mesma bailarina citada algumas linhas acima. O papel denso traz Kidman à velha forma, mesmo com o rosto um pouco deformado pelas plásticas, ainda é possível se emocionar com o trabalho da atriz, desde de a entrega corporal, de sofrimento à flor da pele, de castigo e luta interna ao simples desfile gracioso de sua aura diante das câmeras.

Nicole Kidman voltou porque tem o que doar, tem o que mostrar, só precisa estar no papel certo regido pelo cara certo. Um brinde a beleza e ao talento da grande Nicole Kidman.



FILMOGRAFIA OBRIGATÓRIA

Terror a Bordo (1989)
Um Sonho sem Limite (1995)
De Olhos Bem Fechados (1999)
Os Outros (2001)
Moulin Rouge - Amor em Vermelho (2001)
As Horas (2002)
Dogville (2003)
Cold Mountain (2003)
Margot e o Casamento (2007)
Reencontrando a Felicidade (2010)

domingo, 13 de novembro de 2011

Desconstruindo o Amor e seus Dias ( Crítica: 500 Dias com Ela / 2009)

Um cara conhece uma garota.
Ele se apaixona.
Ela não.




Não dá pra esquecer a fórmula plastificada que é fazer filme do gênero comédia romântica. Simplesmente, não tem como. É sempre a mesma historinha, um cara que conhece uma garota, os dois passam pelas mais incríveis adversidades, pra que no final, eles fiquem juntos e felizes para sempre. Alguns atores já estão extremamente marcados pelo gênero em questão, como é o caso do bombado Matthew McConaughey, a artificial Jennifer Aniston e em proporção menor (graças a um investimento dramático) a oscarizada Sandra Bullock.

Nos EUA, a fórmula do gênero é conhecida como “Boys meets girl”, que se refere exatamente a essa solidificação que acontece dentro dessa tentativa de comédia e tentativa de romance. No final, acaba ficando uma história um tanto absurda, que foge do romance e cai numa comédia escrachada. Porém, não posso fingir que eu não sei que essas histórias sem sal nem açúcar, agradam grande parte do público.



Então, surge um cara desconhecido, diretor de videoclipes, disposto a dar um novo alento as comédias românticas. Sim, ele tem nome e sobrenome: Marc Webb. Pouquíssimo conhecido no cenário hollywoodiano, Webb se dispôs a contar uma história que fosse romântica e engraçada, mas que também se apoiasse em alguns pilares essenciais para dar humanidade e verossimilhança ao gênero tão pouco inovador. Com um ar de cinema independente, surge o fantástico 500 Dias com Ela (500 Days Of Summer. EUA, 2009).

Da mesma forma, que a estrutura técnica do filme se apoiava em nomes desconhecidos, Webb seguiu a mesma linha na hora de montar seu elenco, e não pense você que isso pode ter afetado a qualidade do produto, muito pelo contrário, seria mentira minha se eu dissesse que não culminou na verdadeira quase obra-prima. Alguns podem ficar fervorosos e inconformados com minha entrega e aceitação desse filme. Em comparação com grandes clássicos ou até mesmo bons filmes, ele pode passar despercebido. Mas, o que mais me chama a atenção, é justamente a possibilidade de recriar um gênero totalmente fadado a uma fórmula convencional.



500 Dias com Ela, logo de cara, vai mostrar vários acertos, que por mais que sejam bobinhos, fazem total diferença. Primeiro ponto: a narração inicial da obra, que instantaneamente alerta o espectador a uma história que pode incomodar. Segundo: a contagem dos dias somado a arte visual do tempo, que significa o quanto aquele dia foi bom ou não. E terceiro: a narração não-linear, o diretor não se vê obrigado a contar os passos das personagens seguindo uma lógica cronológica (soa estranho), ele vai e volta no tempo com muita habilidade. Essas características por si só já tornam a trama mais complexa, diferente de uma comédia romântica no “talo”.

No mais, a história inicial segue um pouco da receita, Tom (Joseph Gordon Levitt) é um cara pouco satisfeito com seu emprego de confeccionar cartões de congratulação, amargurado e que busca, e principalmente, acredita no amor. Sua vida muda quando Summer (Zooey Deschanel e também o trocadilho para o título original) começa a trabalhar na mesma empresa. Logo ela se torna sua ambição amorosa. Summer não acredita no amor, prefere ter relações curtas e pouco sérias. Com o cenário montado, o filme vai contar exatamente os 500 dias em que Tom viverá em função de Summer.

No decorrer da narrativa, Tom se vê cada dia mais apaixonado por Summer, enquanto ela se mantém, na maioria das vezes, fria e independente. Pode-se ver um pouco da tradição que Webb traz dos videoclipes. Numa das cenas, o personagem de Gordon-Levitt canta e dança na rua, após a primeira noite de amor com Summer.



A trama é recheada de bons momentos, como a cena (a melhor) em que o casal assiste a Primeira Noite de um Homem no cinema, e reagem de formas distintas ao término do filme, um aos prantos e o outro aos risos. Também temos a cena em que a tela é dividida e de cada lado é mostrado as visões diferentes do mesmo personagem: a idealização e a realidade, o que ele esperava e o que realmente aconteceu. É um trabalho magnífico de composição e ideias tão inovadoras para o romance contemporâneo.

A força da obra está na química entre os dois atores. Parece que um foi feito para o outro. Gordon Levitt, que se destacou em A Origem (2010), consegue dar todo o ar juvenil e apaixonado a Tom sem cair em nenhum tipo de exagero. Zooey Deschanel, que está linda e parecidíssima com a cantora Katy Perry, é um estouro. É quase impossível não se apaixonar por ela também. Os dois atores conseguem fazer com que o público se identifique de A a Z com a história e com as personas.



O trabalho também está apoiado numa fotografia que esbanja alegria e cores, diálogos pertinentes, olhares difusos e trilha sonora especialmente encantadora: tem Carla Bruni, Pixies, She and Him (da protagonista do filme), entre outros nomes de peso. A obra também tem intensas referências a grandes filmes da história do cinema, às vezes nos remete a Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (2004) e fica clara a inspiração no clássico de Woody Allen de 1977, Noivo Neurótico, Noiva Nervosa.



Daí o filme termina e você se vê de boca aberta diante dos créditos finais. O filme não finda tão bem, não vai de acordo com nenhuma de nossas expectativas, é cada um para o seu lado e cada qual com seu carma (se houver). Você não sabe se chora ou se sorri, mas tem certeza do deleite que foi poder apreciar cada minuto da obra.